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terça-feira, 19 de julho de 2011

Apagando rascunhos

Hoje decidi apagar velhos rascunhos, alguns que guardava em gavetas virtuais, outros em folhas de papel que vou guardando sem guardar, e ainda outros que guardo em minha pele, que se arrepia com significados, daí depois passam ao texto, e ainda outros dentro do território do meu corpo e minha mente. Reconheço que foi doloroso ler o que um dia senti, o que um dia foi lume, mas não chegou a arder em poema, em momento de magia, ora igualmente se converteu em cinza...

Pobres palavras armadilhadas em meus sentires, condenadas a morrer sem serem lidas; mas rascunhos são assim, e eles sabem que são isso, sabem de seu destino, como nós sabemos do nosso, como nós sabemos de nossos dias de inverno e primavera que aguardavam por seu verão, porque é apenas no verão que a vida frutifica, e agora e verão e os rascunhos, tinham que florescer, mas passou seu tempo, e eles tem que ir, nada deve ser guardado além sua fronteira de vida... Lembro-me hoje de outros verões, aqueles nos que íamos um dia inteiro para o rio, toda a roupa era carregada no carro-de-vacas: lenções, mantas, casacos, camisas... tudo ia para o rio, e voltava limpo, esta limpeza minha de hoje é o mais parecido com aqueles dias no rio, dias de beleza azul das flores silvestres, livres, como éramos...

Mas eu apago os meus rascunhos sem ir ao rio, podia ir, mas a veiga da infância fica longe demais para meus dias sem horas tantas, e então eu apago os meus rascunhos tranquilamente em casa, tomando um vinho, branco, como metáfora de folha em branco, dia em branco, vida em branco... O tinto reservo-o para esses poemas que sim serão escritos, sonetos fortes, clássicos, como o tronco das videiras... É verdade, mais importante que saber o que escrever é saber o que não escrever, por isso eu parei de te escrever cartas, foram rascunhos, que eu agora apago sem maiores danos, como tu e como eu, que fomos também rascunhos do que não chegou a ser... É claro, fica a saudade, como cinza do fogo que não chegou a arder.
 
Concha Rousia

 

4 comentários:

  1. Estou cá a pensar... será que a plenitude do eu não está justamente nos rascunhos? E se... se... se se apagar esses rescunhos o que restará?

    Bjs amada, seu escritos encantam... sempre...
    Hosamis.

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  2. Hosamis: minha querida, apago rascunhos para desfazer-me enquanto faço outros... eu escrevo sempre diretamente, nunca faço rascunhos, e se faço sei que é para apagar, portanto depois eu um dia apago... mas dói, dói muito, mas me tenho acostumado a dor das perdas... Beijos amada da alma, hoje sinto necessidade de um abraço e o teu chegou justo na hora... Como é bom conhecer-te assim, de coração... Concha

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  3. Ok, você não respondeu então eu respondo: restará a marca. Ou seja, uma vez escrito é impossível demover o sentido, para sempre incrustado. Ah, as marcas, as marcas fazem de nós o que somos e fazem de nós os nós de nós mesmos. Nós, às vezes, tão apertados de nós que nos embaraçam, e nos confundem, e nos enganam levando-nos a crer que não somos nós! Minha querida, queria te pegar no colo...

    Bjs e fica bem, estou sempre aqui...querendo te dizer tanto, mas tento e acho, eu acho que consigo, mas isso, isso tudo não sou eu que digo, porque não sou forte assim... é além de mim, talvez você mesma que me penetra de tua essência... Não tem importância, pois te amo e aceito satisfeita! (rssrss).

    Hosamis

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  4. Hosamis, amiga da alma, a cada vez que me escreves pegas em mim no colo, tuas palavras são braços que atravessam noites, oceâneos, e chegam a minha alma sempre acordada... Nós todas e todos somos feitos de pó de estrelas, e então eu tenho certeza de que nós duas somos feitas da mesma estrela, do mesmo naquinho da mesma estrela, por isso eu te adoro e sinto como me ilumina a tua, nem muito merecida, presença em minha existência... Beijos

    P.S.: Sim, é verdade ficam as marcas, e ainda ficam alguns textinhos teimosos que não se deixam apagar... rsrs

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